sexta-feira, 20 de maio de 2016

do incompreensível ao indelével

Me leva para praia, para o campo.
Assento de couro, música alta, vento no rosto.
Lagoas paradas de superfície calma e profundidade turbulenta.
A cada km corrido vou me ajustando a você.
Fora dos limites de São Paulo, a fantasia de roça, de praia com coquetel, biquini e piscina.
Descobrir o que te apraz é meu alimento, aprendo teu alimento, nos alimentamos das diferenças.
No frio seu agasalho nas quinas das minhas tangentes, me fazem rondar em volta de sua proteção.
Da fragilidade da inocência, do sucesso do interesse, da união de princípio de história.
Na cama na primeira vez, foi do jeito que a moça deve ser, na segunda, terceira...foi martelando a posse, a perda, a falta, o gasto.
Da importância das histórias, a fim de fazer a história, tantas histórias no teatro.
Muito bom, muito ruim meu conhecimento perdia para uma carne e voz, a qualidade de acordo com nossos vinhos depurados no paladar.
O cinema era em dia, o europeu, o argentino em todas as tramas uma pulga atrás da orelha, mas as músicas eram nossas sem fantasia.
A vida junto caiu na realidade da labuta, música enlatada, teatro para o novo, cinema para colar.
Toda cultura da nossa novela, repete o episódio da vida breve e só uma, com personagens novos.
Musas da plateia, atrizes sendo pessoa comum, o espetáculo é nosso fim.
Vem, vem. Isso, mostra, expõe.
Devagar ou rápido?
Vai no seu tempo, do jeito que você gostar.
Ah que bonito, que delícia. Mas é isso e só.
Quero-quero. Raiva de um, de todos, geral.
As causas todas são minhas, suas são todas minhas, nada meu, nada seu.
Volta aos clássicos, aos lentos, aos tristes, aos documentários.
À catarse, a emoção, à lágrima.
Do incompreensível ao indelével.
Irã. 
 

quinta-feira, 12 de maio de 2016

sim, ele não é seu


Sim, ele não é seu......
Você namora, ele canta sua amiga, você é casada, ele sai com as amigas dele, você amamenta, opa, momento certo.
Você adota a postura da mulher árabe que sabe mas não fala, você encontra sua paz.
Ele goza.
Você aceita tudo quando namorada, faz suas firulas e recomenda às amigas.
Até ganhar barriga, começa a dar conselhos de fidelidade, de ciclos. 
Faz quiz de sinais se ele te ama, encontra distrações, corre com as amigas.
Momento certo uns pegam putas todo dia, punheta, boquete enquanto você cuida dos filhos pequenos.
Outros querem uma amante trouxa como você.
Vê seu filho crescer e goza com o gozo do seu marido e curte Marisa Monte.
E o homem precisa que você seja trouxa, que suas lágrimas e sua luta purifiquem este pau aleatório.
E você quer passar por esta situação, por cima por baixo, mas atenção:

porque tem amantes que querem que seu casamento dure para ela usar ele a seu bel prazer até você descobrir, portanto descubra na hora certa: com casa e filho.

E seja trouxa.

terça-feira, 10 de maio de 2016

porn food


Na quitanda vi o tomate apodrecendo, rejeitados com fendas qualquer e todas as casas extraem molho. 
Os últimos serão os primeiros, eles com entradas na polpa e meio caminho andado sem a pele era a imagem da fartura, de potes e mais potes armazenados para um macarrão esperto. 
A sensação de tomate vermelho podre com fenda vendo a polpa, quase pelado é o desperdício do bom proveito.
Escolhe as berinjelas cautelosa, cada furinho é certo uma minhoca que passeia na carne, chegou antes que você e tenta adivinhar para não compartilhar. 
O babaganush vem com aroma de roxo no fogo, de lenha que defuma o sabor.
Agrião é ele, ela é couve flor. Ela é beterraba, ele pepino. Ela rabanete, ele couve de bruxelas. 
Todos eles curtem pimentão, cebola e limão.
Faz tosca a torta diz quiche de alho poró. Faz integral torta de escarola. 
Olha as bananas, amarelas, bananas. Cachos. 
Coloca duas tangerinas embaixo da blusa, se exibe rindo da prótese. 
De peitinhos empinados espertos sabe que a Ponkan não tem caroço, o doce da outra perde para a facilidade. 
Compra uma maça por vaidade, duas peras quer mergulhar no vinho, se lambuza com caqui e seu centro de gosma, brinca na língua. 
O abacate tem sustância, pega, aperta, fura, chupa; é peito, é pinto.
Mamão na mesa de manhã, para quem pode, sem semente.
Coentro no peixe, cebolinha no cuscuz, salsinha em muita outras, dill no salmão defumado. 
Todos verdinhos picadinhos areia quase imperceptível deixa sua marca e o tempero da erva.
Peixes sem escamas expostos com suas bocas bobas sobre branco estático.
Passou, olhou o namorado, levou atum na duvida do linguado.
A tilápia e a pescadinha vão se ver na farinha e fritos.
O arenque nem no pão, nem debaixo de rolo de macarrão.
A lula estica na boca, come o corte inteiro ou corta com o dente o que sempre estica.
O polvo beija da ventosa e embarco na nau do argonauta que é um mito frito na manteiga.
Requeijão é Luana Piovanni, catupiry é Mariana Ximenes, queijo branco é Audrey Hepburn, ricota Natalie Portman, mussarela é Julia Roberts, queijo prato Nicole Kidman, queijo brie é Marylin Monroe, emmental é Rachel Weinz, queijo de cabra Winona Rider e mussarela de buffala Sofia Loren.
Isabel Filardis avelã, Tais Araújo castanha do pará, Sharon Menezes nozes, Camila Pitanga amendoa.
Damasco é o homem.
Eu sou todas as pimentas.

ah tem dó, ele fala por si só



Ah tem dó.
Ele manca na minha frente mas atravessando a passarela por cima da avenida seu passo é esperto. 
Seu olho é azul e vermelho é a cor que condena.
Ele quer saber se estamos no inverno, ah tem dó, ele pensa na estação.
Ele é bonito, ele quer saber o que é carisma, ah tem dó.
Ele me oferece cachaça, um bêbado sozinho, ah tem dó.
Ele perdeu a guarda da filha, a ex-mulher não deixa vê-la, tem dó dela.
Ele vai falar com o ex-patrão, não sabe se vai reaver seu caminhão. 
Ah tem dó.
Ele diz que vai fazer a barba, diz que vai ficar bonito amanhã e sorri e a chama de vossa alteza.
Ele diz que ama sua inteligência, ele a ama a cada dia que passa, ele ama sua beleza.
Ela empresta um livro da Zibia Gasparetto, O amor venceu. 
Ele diz que vai ler e anotar, ele conta todo dia o que está acontecendo no livro, o nome dos personagens e o que fizeram. 
Ela imagina ele sozinho lendo, com a perda do amor.
Cada dia que passa se declara seu amor alto e bom som e ela ri descontroladamente.
Cada dia que passa ela evita olhar para ele, ela tem asco de seus pelos.
Ele fica bem de amarelo mas é a mesma camiseta todos os dias.
Ela também é carente mas entregar o ouro quando nem ouro há, fica sem jogo.
Ele não quer saber se ela se incomoda com sua mancada falsa, com suas perguntas burras, com seu alcoolismo, com sua falta de estrutura. 
Seu amor egoísta só se preocupa com o estandarte do ridículo e ela ri descontroladamente. 
Ela só pode emprestar um livro espírita e ouvir suas histórias.
Cada reação positiva ou negativa a ele, o amor dele cresce, ela respeita a chama acessa mas ele precisa dar ignição na vida dele.
Ele não prestigia ela e ele fala por si só.

segunda-feira, 9 de maio de 2016

olha


Ela conta de sua tia cega enquanto lembra da casa da infância com folhas no chão, grama alta e escadaria. –Muito parecida. Diz
Histórias do passado também trazem infelicidade, lembramos da tenra infância em festa mas acompanha o sentimento que se divide. Não falamos do que desagrada mas está lá em alguma gaveta silenciosa, a desgraça não se conta pois nunca se supera ao ponto da ironia de sua dor.
Olha, a tia cega era inocente, não sabia de nada e ainda assim era enganada, mas sabia de quem desconfiar. Aquela casa trouxe tia Zumira.
-Olha, essa casa, com portão e acima grade de segurança, -Dá para o céu, uma casa de frente para o oceano em SP.
- Que bom que tem essa praça vou fazer exercício.  
 -Agora me conta para que essas máquinas, para quem não tem caminhão?
 -É muito bom para os braços, alonga. 
 -Essa casa é chique.            
- Mulher de bom gosto e marido também.
-Certamente mulher com bom gosto, marido com bolso.
-Vamos escrever sobre as casas?
-Escrever sobre o chique não tem graça, mas se tudo que a gente imagina não for escrito, não existe.
- A imaginação e a realidade, você precisa ler Pablo Neruda.
-Casava com Pablo Neruda, corria atrás de seu carro.
- Olha aquela casa.
-Malibu, essa palmeira parece coqueiro. Eles serviriam uns tapas.
-Nossa essa casa é minha cara.
Paramos. A casa era linda, de pedra, com escada um jardim acompanhando entrada de vidro.
- A essa é a casa do vovô, entrada com mosaico russo, cadeira de balanço.
-Essa é assombrada. Medo. Não é do sonho mas moraria nela.
-Essa é bem sem graça né? Salmão, porta bonita e só.
- Que cheiro é esse?
– Dama da noite. 
– Tá, mas onde está a árvore? 
– Aqui, de flor amarela.
– Só conheço a lilás e branca. (cheirei) Tem cheiro de boneca menina flor que usava toca. 
– É.
-Olha essa casa! Um altar com vela e uma santa. 
– Precisa fazer um minuto de silêncio.
- E essa?  Senta um jovem sem camisa com fones de ouvido. 
– A casa eu não sei, que menino bom. Sentava ali no sofá com ele. Oi Tia. 
– Precisamos tirar foto de todas essas casas. 
– E o menino? 
– Fica na intimidade da nossa imaginação!
-Tem um cata-vento no jardim. 
–Tem também dois pneus. Essa casa é de doido. Olhamos dentro, muitas plantas na mesa de jantar 
–De senhora. 
– De senhora doida varrida. 
– De feirante, olha a barraca dela.
- E essa do fusca vermelho? 
– Ah tem arquitetura legal, é de pesquisador.
- Ah essa é a minha cara. Casa feliz. Que nem sua amiga que se programou para ser feliz.
- Não posso andar nessa rua. Morava ali.
Andamos em silêncio, olhei para cima vi um homem, me assustei e dei boa noite ela também deu.
-Achei que estava vendo assombração dei boa noite para confirmar que era humano, parecia o Frankstein. 
– Também achei, por isso dei boa noite.
-E essa casa? 
– Essa parece do nordeste, bora ver televisão com a vizinha Tia Maria?!
Voltando o percurso.
-Você ouviu? Você ouviu? Não via nada e gritos de homem. 
– É aquele homem na praça agonizando. 
– Onde, não vejo, cadê? Vi, credo, ele vai morrer. 
–Ei, ei, (para o tio da casa da Tia Zumira) Ei, ei você é surdo? 

Achei que eu estava no além, com um homem agonizando na praça e um surdo assoviando em seu jardim de grama alta.
-Você é muito frágil, se impressiona e pode não voltar.

-Eu grito, eu agonizo, mas eu volto.

- Tia Zumira era muito bonita e ficou cega, fizeram macumba com o cabelo dela. Inveja.
- A inveja só existe da propriedade do outro. Alguns querem o carro, nós a casa e levaram a visão de tia Zumira.

sexta-feira, 6 de maio de 2016

mulher?



O homem precisa da mãe.
Da mulher, ele critica que ela seja noveleira. Da tela ele idolatra a malvada interesseira ou a boazinha do rancho, até a desvirtuada que não obedece a palavra do pai ou a novinha com sonhos.
Ele só deixa você ver novela em casa para não ouvir detalhes do seu dia.
Mulher em casa é um bicho calado e contemplativo que fia o pensamento tortuoso e planeja vinganças perfumada. 
Quando ela quer pegar mais pesado ela lê um livro.
No silêncio tem uma relação de amor inaudita.
A mesa o prazer, a bebida o orgulho, os talheres a consideração (mesmo na troca de mãos), o guardanapo a pretensão e a agilidade, delicadeza ou brutalidade da fome uma história pessoal.
Apetite, dia bom, inapetência, baixa estima, dieta, luta.
Espera a sobremesa para saciar frustração, ansiedade e carência do prazer chegar ao fim.
Inicia trabalho da depressão em cavidade e o convexo dever da louça que espuma e escorre a limpeza.
Distribui o resto em lixos, parte técnica de desapego que se encaminham ao jardim, animal e ao itinerário da cidade na dependência do lá fora.
A casa é uma grande coxa de frango com alecrim roída até o osso da sorte.

Eletromésticos trituram frutas, legumes, raivas; lavam roupas, amores, desvalores; fritam filés, invejas, autoridades; congelam peixes, preços, temores; assam bolos, carinhos, companhias; café; expresso de morte, de amargo, de doce, de fim. Pula para a fruta descasca caráter, economia, saúde.

O homem precisa de ferro e cálcio (etc) para ferver seu sangue e firmar seu osso.
A mulher sustenta rebaixada o papel usurpador da mãe e de seu enigma da posse do filho que não é seu, cuida de terminar tudo que começou. Conservar picles, compotas, marido.

E diz muito casada.

Quer processar personagem bandido da novela, ver a moça do rancho vingar, sofre com a desvirtuada que não obedece a palavra do pai e sabe que a novinha com sonhos pode se dar mal.

quinta-feira, 5 de maio de 2016

gala



Você pensa que vai me comprar? Eu quero atenção que preste.
Você me elege pelo meu carinho e estou esperando uma fita de cetim para amarrar no meu dedo e lembrar que você lembra de mim.
Presente de armarinho, baratinho, que mamãe visita para fazer suas graças. Ela que cuidou bonitinho de mim, que me vestiu do jeitinho que sua mãe aprova meu bom gosto.
A minha melancolia, de todas as cólicas que me vem e que não devo pensar mesmo sentindo, sozinha a essa função hereditária ao me encolher como feto. 
Me esquento e cuido de mim sem expectativa de mãe que largou a mãe.
Nesta estrada caminho ao seu lado, você em linha reta quer todas as curvas.
As depressões, obstáculos, acostamento é meu trajeto, que sigo andando ao seu lado sem analise da mecânica do veículo. 
Sou óleo lubrificante, sujo, escuro e que pode trocar em qualquer quarteirão.
Começo a rodar mais, gastar mais gás, embuída da alma, sentimento e pensamento que vislumbra um horizonte que se distancia quando me aproximo. 
A caminhada pede graça, ternura e histeria.
Fora do esquadro sem a justa medida, tem a crítica que me iguala a mil, dez mil, todas iguais. Únicas cada qual com seu desenho, de beleza a indecência, de poder a opressão, de liberdade a repressão. 
Como dizia meu pai a dor é mãe e como dói.
Assassino minha complexidade, vivo sozinha minhas fabulações sobre o pé estrangulado, ainda tenho tesão.
Tira minha inocência, quer minha ingenuidade. 
Seu amor estampa a mentira, meu amor é escolha que nunca alcança, indiferença que nego com calor, tristeza que entusiasma com alegria da amiga, amiga que me trai pelo que tenho, sustento o que não é meu.
Vocifero a cólera da praga que alastra em todos meus centros e pela periferia sou bandida, criminosa e passional.
E a razão é o terno de alma boa.

segunda-feira, 2 de maio de 2016

mala doméstica e casa no peito



Viagem internacional é transpor a porta do aeroporto no embarque carregando mala doméstica e o interior da casa no peito. É despedir da família com dicas e apertos para não entrar em situação de sufoco.
Deixar o namorado com promessa de pureza e celibatos foi a dose.
Escala em Dallas, sem a bagagem, fumei um cigarro do lado de fora do aeroporto e vi uma revoada de corvos barulhentos povoando minha nublada sensação despedida.
Você chega no estrangeiro e as providencias primeiras somam o dobro do dinheiro, você se julga burro por não calcular.
De primeira viagem coisas como o bilhete do ônibus para o mês, pen drive enquanto não perder, pilhas, são troco.
Estar numa homestay tem a vantagem das dicas de sobrevivência, consumos do provisório a preço bom em estabelecimentos como loja de departamento, afastado do centro, que se chega com o carro deles, um atalho.
Mas brasileiro diz: “quem converte não se diverte” e assim gastei feliz no primeiro dia o equivalente a um sexto do meu budget. Pelo desfalque dos próximos meses brindei com café da Starbucks. E grata pelo ritmo acelerado da minha momstay, entrei no mercado da galeria com vontade de comprar nossas frutas de inverno.
1 kg de castanhas de caju e brasileirinho de Maria Bethânia foi meu presente do Brasil.
Queria comer cashues com eles, me senti enganada na loja de departamento, por não comprar shampoo, sabonete e pasta de dente.
A realidade é que eles acham que quem faz intercâmbio é muito rico e desfrutam do dinheiro da acomodação minha em troca da cultura deles.
Porém ficava no porão, aprendi naquelas de pronto em inglês como lavar a roupa na área de serviço, frente a meu quarto na casa pré-fabricada.  
Tinha uma chave do portão do quintal e outra da entrada de baixo que eles também usavam. Momstay me explicou as trancas na saída, falou que trabalhava na CityHall, prefeitura, fumamos um cigarro juntas e me recomendou o DuMarrier.
Senti independência. Apesar de fumar 1 cigarro fracionado por dia.
De manhã coincidia meu horário com a escola da menina, sua filha, e conseguia tomar cereal com morango desidratado com leite.
O pai policial estava afastado do trabalho e cozinhava para todas no final do dia. Tratava de comer cada pedacinho com bastante elogio e pouca sacies. Com o passar dos dias e minha frequência na escola, sempre presente, fim de tarde com frio e fome encontro a cozinha trancada. E assim todos os outros dias.
Adorava o lanche de criança de almoço, pão com nutella e pasta de amendoim, todo dia, sem falta, sem suco! Comecei a reparar nos lanches dos colegas do curso da ILSC, eram mais substanciosos ao menos não era cup noodles.
Mas tenho a característica de não modificar as coisas e me adaptar a realidades, por isso aproveitava para tomar um suco na lan house, usar o msn e email, fazer ligação com meu cartão para o Brasil.
Os telefonemas sempre falhavam, decidi não gastar mais com cartão, nem sabia da existência do Nextel muito menos da portabilidade. Fui deixando de narrar minhas descobertas para a família e o namorado ligava sábado de manhã na homestay.
Acordava todos os dias sozinha, quase não via mais a menina na casa, subi na cozinha e comi apenas um pote de cereal, com vontade do segundo mas entendi que era fracionado.
Acordei com neve e os meus passos foram os primeiros a deixar rastro naquele março.
Neste momento comecei a atravessar a ponte para escola a pé, o ônibus era quentinho mas eu tinha mais tempo para ouvir música com meu diskman e ver os trabalhadores civis, loiros e lindos;
Sentia falta de amigos, mas pensei em ficar longe dos brasileiros, mas como não ser amigo de brasileiro? Havia grandes grupos de brasileiros, só observava, porque não tinha identificação nenhuma em ouvir Jamil e uma noites, que conheci por eles, ou alugar limosine para ir em balada de brasileiros.
Estava em Vancouver, Canadá mas viver a vida dos nativos também parecia ilusão.
Um dia ia ao shopping com uma colega que saia com muitas sacolas da Gap e eu de mãos vazias, outro dia ia na loja de maconha e pipe com o pessoal que fumava maconha verde florescente, maravilhosa no cachimbo num barzinho para acomodar e lucrar na larica.
Não estava feliz! Voltava para casa e ainda encontrava a cozinha fechada.
Minha família era de descendentes de britânico, na colônia de British Columbia, mas quase não participei de seus programas, só no dia que cheguei para compras pedi e eles que me deixaram um livro de grandes poetas ingleses e americanos que lia e traduzia diariamente como John Keats, T.S.Eliot, E. Cummings.
Estava estranhando muito ficar sozinha, as trocas esporádicas de e-mail com minha irmã Mariana eram confissões do meu espírito e ela enviava frases de Cioran. A foto do ano novo que passei junto a amigos e irmãs era a força para continuar e querer voltar: Saudade.
Visitei o bairro de assistência social com travesti com plástica de quinta que o deformou, salões para injetar heroína até a morte, mendigos bem vestidos em relação ao Brasil, por causa do frio.
Cioran permitia a leitura dos que vagavam naquele reduto em um amparo sagrado, social e mundano.
Voltava para casa vendo elásticos no chão, parava no boulevard e me purificava no bairro náutico banhado pelo Pacífico, com muitos barcos atracados na costa.
Esquecia da fome, na rua não queria gastar muito dinheiro, queria deixar para esquiar ao ver todos os dias o cume da montanha com gelo, Whistler. .
Os totens nos parques começaram a me impactar no monumento que busca raiz.
Nas andanças descobri o cinema Paramount, entrei e assisti a Nanny Macfee.
Emma Thompson, inglesa protagonizando, criou um mito acerca da minha momstay.
Mudei de casa, queria comer melhor e fui para um bairro nobre, casa grande, quarto com cama queen e calefação.
Assistia televisão com a filipina, fui para Whashington com ela, suas filhas eram carismáticas e compartilhei o andar debaixo com uma japonesa.
O grupo de brasileiros e suas baladas não me interessavam, as filipinas eram bem dadas, os japoneses homens mudava o mês abria outras classes e eles ficavam com a mesma professora fiéis e afeiçoados, as japonesas não se separavam de seus tradutores e provisões, as mexicanas eram bonitas e se agrupavam como os brasileiros, os europeus sabiam de seu glam.
Fiz compras em downtown, joguei bilhar, ia em loja de discos tudo guardado até hoje.
Meus amigos eram Fabi, Wilton e Walter...todos insatisfeitos com a Disney World protestamos em um pub com grandes pints e torcedores de futebol.
Fabi era noiva e queria promoção na empresa, dominando o inglês, Wilton era noivo queria conhecer de tecnologia, Walter queria ficar comigo na falta de levar bronca de seu chefe no Brasil e termos uma experiência juntos de durões em Vancouver, com visto de estudantes.
Fomos para Whistler. Eu não tinha luvas de tactel e Fabi estava mal agasalhada.
A montanha nos jogou, cada um de nós separados fomos explorar as descidas.
Eles foram de snow board eu e Fabi ski nos vimos no final, gelados e cheios de adrenalina.
Fiquei com medo de perder a mão, que estava enrugada e congelada.
Fabi aqueceu minha mão entre as suas. Um dia não vi mais Walter, me arrependi de não ter feito parceria, em nome de um celibato e Fabi foi para Toronto.
Continuei meus passeios...peguei um ferry boat e fui para Ilha Victoria.
Via gaivotas voando ao lado com o vento gelado e pinheiros na orla.
Chegamos, o guia me levou até uma parte, falava, mas resolvi mandar postais para meus pais.
Na ilha Victoria, separada da excursão, entrei numa loja de departamento e me deslumbrei com um relógio da Roots, perdi o horário de volta e a excursão..
Pedi para uns meninos bonitos que esperavam também a volta para Vancouver para ajudar a ler o manual do relógio, entrei no ferry boat e conheci um japonês que fazia universidade da British Columbia e aproveitei o restaurante do barco numa conversa que me pareceu que era o começo da viagem.
Mas o conselho da escola ficou preocupado comigo, ligaram para o Brasil. A conselheira pegou os dados do cartão de crédito do meu pai, comprou minha passagem.
Aya a japonesa que compartilhava a homestay, com quem assisti O Sorriso de Monalisa num combate para ver qual das duas fazia melhor que Julia Roberts, me fez um mini cartão rosa com corações minúsculos dizendo que sentiria saudades e chorou.
Perdi a hora e ganhei uma raiz numa província.