quinta-feira, 19 de maio de 2011

Manequim em movimento

O salão admite sua beleza.
Entre os que entram e saem, ela intermedia a passagem com um sorriso trabalhado.
Controla dinamicamente o movimento do salão.
Antecipa gestos e mantêm uma distancia tolerável entre todos por ali.
Enquanto fabrica sorrisos espontâneos para cada cliente, maquina idéias distantes daquele lugar. ´
Sua vaidade é o esforço diário de postar-se integra, dividida entre o aqui e o acolá.
Ao lado do caixa, que freneticamente computa as notas, ela se relaciona com o ritmo.
Cercada de pessoas por todos os lados, entretanto, em seu posto é só.
Dotada de boas maneiras traz suavidade para o local, mas em alguns momentos suas mãos cruzadas denunciam insegurança e aflição.
Tenta ser natural porém como cartão de visita, sua aparência é fingimento.
É um objeto atuante para o bem estar alheio.
Não é subserviente, o que por vezes causa antipatia.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Retrato de uma degenerada na cozinha

A saudade do rosto fervoroso, bocas repuxadas que confidenciam o desejo que extrapola do corpo e das palavras, Beca e Joca se encontraram ao ar livre num sábado ensolarado e tiveram que se comportar.
Neste calor, a brisa foi ficando fria e as vestes inapropriadas para o local.
Refugiados para o interior de suas casas, passaram pelo tempo até se encontrarem novamente, na noite fria.
Já na casa de Beca, a interação de Joca com seus familiares mexeu com os brios de sua mãe que orgulhosa do relacionamento de Beca, exerceu o papel de uma matriarca típica querendo provisionar todos os itens relacionados a cozinha.
Beca tem uma aparência mais frágil, mesmo pontual, incisiva, assertiva e intensa no seu comportamento, casca de um espírito de índole sentimentalista. Sofre de um reconhecimento estranho, que si própria se convenceu ou por convenção de forças externas. Assim, Beca é repelida de algumas funções hereditárias da representatividade da mulher, vista como um tipo degenerado, que corrompe o padrão e ameaça a família e a tradição.
Por isso a palavra dela é de ordem, atualmente, no âmbito familiar. Conferindo a conquista de uma autoridade ao formar um par amoroso, com Joca, mas seu espírito é esmagado pela orquestração social e para ela tudo é absolutamente definitivo, quando para o outro, no caso seu par, de acordo com as circunstâncias, relativiza.
Para Beca, isso é inadmissível uma vez que tem espírito de índole sentimentalista, o que é terminantemente inseguro para Beca, que tem uma expectativa de estabilidade e acredita que o amor é incondicional.
Joca como economista, aborda a realidade com perspectivas concorrentes e ao mesmo tempo opostas e sempre abre possibilidades nos fatos vivenciados em comum ou histórias que mexeram com Beca.
Mas é precisamente nesta crença irrestrita e independente do amor incondicional que Beca ,uma vez provocada nos nichos sociais provoca em Joca, a partir de seus rumores, escândalos pessoais: subversão da ordem, fúria e revolta e encontra nele o amparo emocional que descarrega como um raio.
Nesta tempestade, sua mãe, que provisionava itens da cozinha, evidentente, não destituída de sua robustez e vigor de uma dona de casa, em seu castelo de afetos ordenou desapercebidamente Beca que com um orgulho ferido, acatou as regras da mãe com um controle fervoroso ao retirar do armário inferior da cozinha objetos que encobriam o recheau para o fondue daquela noite. Beca manifestou-se contrariamente com um pingo de razão: a recusa do recheau, que não tinha fogareiro. Ao sua mãe acatar a esta observação, Beca inverteu a ordem natural de mãe para filha.
O positivo é que sua vontade prevaleceu a despeito da sua mãe mesmo sem concordância, mas foi impelida a se redimir por não estar acostumada a esse tipo de poder que exerce.
Miséria fonte de riqueza, índice de esperança.